A atual revolução tecnológica tem impulsionado no desenvolvimento de novas empresas, principalmente as de tecnologia financeira, as chamadas fintechs. Tal crescimento ocasionou em um mercado financeiro mais acessível e, por consequência, chamou a atenção de instituições reguladoras.
Um dos princípios das fintechs é justamente a democratização de serviços financeiros, já que a maioria destes é ofertada apenas por bancos. Logo a partir dessas empresas, foram criados serviços financeiros não “bancarizados”como plataformas online de investimento, empréstimos peer-to-peer, aplicação de blockchain e gateways de pagamento.
Tecnologia auxilia na ampliação de crédito
Outra oferta de serviço que está crescendo graças a participação de fintechs é o de crédito, que tem ajudado consumidores, profissionais autônomos, micro e pequenos empresários na obtenção de novas alternativas de financiamento.
Segundo estudo Fintech Mining Report 2019, realizado pela Distrito (holding de negócios) o Brasil já contava com 550 fintechs em 2019. Dessas, 85 integram a lista de fintechs de crédito. A expectativa do Banco Central (Bacen) é que até o fim deste ano o número chegue a 750.
Além dessa projeção, a Associação Brasileira de Fintechs (ABFintech) também constatou que o volume total de créditos concedidos por fintechs deve ultrapassar R$ 2,5 bilhões este ano.
Para o Bacen, as iniciativas digitais estão democratizando o crédito, levando alternativas de financiamento e produtos bancários a brasileiros pouco atendidos pelo sistema financeiro. O mesmo estudo constatou que as fintechs de crédito tem concentração de público de menor renda, sendo 79% destes de classe C, D e E.
A instituição financeira também prevê que iniciativas como Open Banking vão estimular a participação de fintechs no crédito, que ainda é singela, levando em consideração um mercado de crédito no país que supera os R$ 3,3 trilhões.
O modelo Open Banking, que começa a ser implementado ainda este ano, estabelece regras de como devem ser feitos o compartilhamento de dados e as ofertas de produtos e serviços por instituições financeiras e demais instituições autorizadas através da abertura e integração das informações.
Com a aproximação da vigência do Open Banking no Brasil, diversas instituições financeiras buscaram se adaptar às novas exigências, uma delas foi o Banco do Brasil, que no final de dezembro de 2019 anunciou que seus correntistas poderiam comparar e contratar empréstimos pessoais por meio da fintech Bom Pra Crédito (BPC), maior marketplace de crédito online do país.
A plataforma da BPC unifica credores e tomadores de empréstimos através de experiência completamente digital, desde o cadastro até a conclusão do contrato. Alguns minutos após o preenchimento de um formulário online várias ofertas de crédito são disponibilizadas aos clientes, que podem optar pela que mais se enquadra em seu perfil. No caso do credor, este tem acesso a uma plataforma Credit as a Service (CaaS), que através de inteligência de dados permite a concessão de crédito de a milhões de clientes.
Além da parceria com o Banco do Brasil em 2019 a BCP recebeu um aporte de R$ 35 milhões liderado pelo Grupo Globo. Enquanto parte do dinheiro é voltado para mídia, o restante é direcionado a oferta de novos produtos, melhoria da User Experience e desenvolvimento da tecnologia de inteligência artificial para concessão de crédito.
O investimento feito se justifica em função de uma corrida na qual fintechs e bancos digitais procuram atrair a significativa parcela de 45 milhões de brasileiros que utilizam papel-moeda. Esse grupo não se encontra ligado a nenhum sistema bancário, de acordo com pesquisa do Instituto Locomotiva. Essa parcela normalmente recebe pagamentos em papel-moeda, negocia descontos e, quando necessário, utiliza cartão de crédito de parentes.
Como funciona de fato a solução CaaS?
Credit as a Service (CaaS) é uma solução financeira, cujo nome faz referência a serviços contratados e pagos periodicamente conforme sua utilização (as a service). Tais serviços estão largamente propagados no setor tecnológico e financeiro.
A solução de crédito tem capacidade para aperfeiçoar a experiência do consumidor, alavancar as vendas, fidelizar clientes e diminuir riscos. O CaaS é oferecido por fintechs com domínio dos mecanismos essenciais para tomada de crédito. O intuito é desenvolver uma linha de crédito personalizada, ou seja, que atenda as preferências dos clientes ou usuários de um marketplace.
Graças às APIs públicas de bancos, modelos de CaaS vem ganhando mais força no mercado e diversas fintechs e startups aproveitam tal oportunidade de aprimorar o setor de crédito.
Expansão no mercado de crédito
Os Estados Unidos e França (Franfinance) são exemplos de países com soluções CaaS. No caso do Brasil a primeira fintech a oferecer essa solução foi a Zen Finance em 2018. Através de sua plataforma de CaaS marketplaces e adquirentes de pagamento parceiros dispõem de importantes peças para a criar linhas de crédito personalizadas (algoritmo preditivo de análise de crédito, funding para os empréstimos, atendimento e cobrança, etc) para seus clientes.
Dessa forma, a solução CaaS consegue ajudar diversas lojas online que sofrem com curtos prazos, recebimentos parcelados e ainda precisam de capital de giro para se desenvolver. Isso sem contar os elevados custos de crédito para micro e pequenos comerciantes.
Além disso, nessa solução os grandes varejistas possuem muitos dados sobre os consumidores, o que oferece suporte no aprimoramento do algoritmo preditivo que já apresenta informações não convencionais catalogadas e testadas pelas fintech. Há também o uso de tecnologia machine learning na identificação de comportamentos suspeitos (possíveis fraudadores), reduzindo os riscos de inadimplência após o empréstimo.
A IOUU é mais uma fintech brasileira que segue também propõe soluções de crédito. Trata-se de marketplace de peer-to-peer lending (empréstimo coletivo), ou seja, a IOUU capta dinheiro de pessoas físicas a fim de financiar operações de PMEs (pequenas e médias empresas), proporcionando o melhor negócio para ambos envolvidos: pessoas/empresas que necessitam de crédito e investidores que estão em busca de novas oportunidades.
O usuário tem a possibilidade de investir valores a partir de R$ 500,00 em oportunidades disponíveis na plataforma da IOUU. Já as empresas cadastradas na plataforma passam pelo algoritmo da IOUU, que analisa as chances de fraude, faz análise de crédito e da documentação apresentada. Caso haja inadimplência, a IOUU assume a responsabilidade da cobrança, inclusive em processo judicial para recuperar o crédito.
Outra fintech de crédito brasileira que vale a pena destacar é a Rebel. Fundada em 2016, a startup já é avaliada como uma das 50 fintechs mais promissoras do mundo, segundo consultoria KPMG. Em 2019, após uma nova rodada de investimentos a Rebel recebeu um aporte de US$ 10 milhões, liderado pelos fundos de investimentos Monashees e Fintech Collective.
Os serviços de crédito da fintech dependem do uso de inteligência artificial e machine learning para buscar na internet dados do usuário, após o devido consentimento. Isso permite que a empresa analise os riscos e possa conceder o empréstimo em questão de alguns minutos.
E não há riscos nesse modelo?
Provavelmente um dos pontos que há necessidade de atenção é quanto ao autocontrole dos usuários. Poucos são os brasileiros que possuem educação financeira e acabam se comprometendo com empréstimos. De acordo com pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) até 48% dos brasileiros não adotam nenhum método de controle orçamentário.
Com relação às contratantes do serviço, é importante que estudem previamente a fintech que disponibilizam soluções de CaaS. Informações como eficiência do algoritmo para controle do risco e busca para melhor taxa, nível de inadimplência em uma curva de tempo madura e taxa de sucesso na cobrança são alguns indicativos importantes neste tipo produto financeiro.
Por fim, as fintechs que promovem o CaaS necessitam de dados confiáveis e estruturados a respeito de possíveis tomadores de crédito, e infelizmente não é sempre que tais dados se encontram disponíveis.